quarta-feira, janeiro 08, 2014
Aprendendo a contar
Estava eu uma vez brincando de contar. Limitado em meu universo de cinco números reais e inteiros. Eram cinco dedinhos gordinhos me dando um mundo de possibilidades. Logo depois já estava craque nas duas mãos. Era o dobro, eram dez! Através deles eu sabia pedir, mais ou menos qualquer coisa que quisesse. Um, dois ou três chocolates, um beijo de papai e ainda sobravam mais dois de mamãe. Conseguia contar quantos irmãos tinha, quantos cachorros, gatos e quantas jabuticabas ou laranjas queria chupar. Foi logo depois de escorregar cês e esses de meu nome em um papel pautado na mesinha de centro da sala de casa enquanto assistia o Flash Gordon derrotar os inimigos que mamãe me ensinou a arte de escrever e porque não, de ler também. De la pra cá eu queria mais, muito mais. Queria saber contar os feijõesinhos ágil como a doméstica de casa, minha amada Tota. Queria entender os números das contas do fim do mês, queria ler as letras da máquina de escrever Olivetti de papai. e as legendas das propagandas na tevê. Já na escolinha, percebi que de certa forma os professores nos limitavam de zero a dez. Quão foi minha felicidade quando mudei de escola e as notas não mais variavam de zero a dez mas de zero a cem! Minha alegria durou pouco ao perceber que era só uma questão de vírgula que fazia o 7,5 virar 75. Era tudo a mesma coisa, uma grande mentira. Por quê eu não podia tirar um 745 ? ou um 1024 ? Seria tão mais interessante! Quando aprendi a somar balas e chicletes, ovos e galinhas, ainda achava aquilo tudo muito pouco. Me interessava mesmo era pelo tal infinito. Aquele 8 que de tanto circundar em volta de si mesmo acabava caindo e se estirava de forma cansada e magnífica. Afinal, não era fácil revolucionar tantas e tantas vezes assim para se chegar ao além. O símbolo do infinito era transcendente e me enchia os olhos! Contava os segundos no pique-esconde com os amigos da rua e depois os minutos que faltavam para começar os Trapalhões deitado no colo de meu pai aos domingos. As horas para pode sair da aula e andar de bicicleta nas ruas de terra imaginando as rodas girarem infinitas vezes como um oito deitado comigo em cima. Os dias eu contava para esperar minhas próximas viagens de fim-de-semana visitando minhas tias e primos ou esperando as provas, verdadeiras provações non-sense de que todos somos obrigados a passar tantas e tantas vezes na vida. Os meses contava esperando o aniversário e as férias de fim-de-ano e os anos, ah os anos, era uma incógnita na minha pequena grande cabeça. Existia uma nebulosidade entre a infância e a vida adulta separada por muitas espinhas e questionamentos. Talvez fosse melhor não saber contar. Talvez assim os anos não passassem, nem os dias, nem os meses nem as rugas nem os cabelos caíssem. Talvez parasse nas duas mãozinhas. Já seria mais do que suficiente para conseguir tudo o que eu queria. Mas e a curiosidade onde fica? Eu também queria saber escolher feijões, contar além de números, causos da vida, de uma vida bem vivida. Já não conto mais os cabelos que caíram nem as rugas que chegaram, mas eu conto o canto que cantei. Conto o quanto já amei. Conto quanto eu quiser contar. Contar com a beleza humana, com a sabedoria adquirida. Conto com a dor da despedida, com a saudade bem vivida. Conto com encontros, desencontros e reencontros. Conto com você e acima de tudo conto comigo, aqui bem baixinho com a força de um pensamento, quantas vezes precisar contar, o quanto vale viver, pelos lindos momentos que já tive e hei de ter. Conto com você perto de mim, um amor sem fim que foi do um ao oito e ali parou, rodando, rodando até fazer-se cair derrubando-me junto a ti no infinito do amor, lá quase na dor mas muito, muito além. Distante, suave e errante. Revolucionário. ∞
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Um comentário:
Adorei!!!!!!!
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